- Dr. Antonio Baptista Gonçalves
PROGRESSÃO DA DESIGUALDADE
As consequências do COVID-19 impuseram aos brasileiros impactos no
orçamento, aumentaram a concentração de renda e agudizaram a já elevada
desigualdade social para a população brasileira. O desemprego se eleva continuamente,
o comércio segue em crise e o reflexo são problemas econômicos. A taxa de
desocupação para o primeiro trimestre de 2021 foi de 14,8%, segundo o IBGE –
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Isso significa que 14,8 milhões de
pessoas estão desempregadas atualmente no Brasil – o maior número da série histórica
da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – PNAD.
Em São Paulo, por exemplo, 25% dos bares e restaurantes fecharam as portas de
maneira definitiva em virtude das restrições de acesso e limitação de frequência que a
pandemia impôs. Segundo a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes –
ABRASEL – desde o início da pandemia 12.000 bares e restaurantes fecharam em
definitivo na cidade de São Paulo. No Estado, dos 250 mil estabelecimentos do setor, 50
mil deixaram de existir. Em um ano de pandemia o Brasil fechou 7,8 milhões de postos
de trabalho.
Pandemia esta que ainda tem destino indefinido pela morosidade da vacinação
que inevitavelmente se alongará para 2022. Com isso, o retorno do ritmo da economia é
incerto e, quiçá, sabemos se haverá um regresso ao patamar anterior à pandemia que já
não era de grande alento. Com a escassez de recursos, outras desigualdades afloram e se
aprofundam como as raciais, educacionais, além é claro das sociais e econômicas.
No fim de 2020, 29% dos trabalhadores ocupados tinham jornada menor do que
a de antes da pandemia. A consequência foi a redução da renda: 37% dos ocupados
passaram a ganhar menos. Os que mais perderam foram os com menor escolaridade. Em
paripasso o custo com as despesas básicas aumentou 30% acima da inflação. A pobreza
se acentua e a desigualdade social se evidencia ainda mais.
O aumento da pobreza em decorrência da falta de recursos fez com que a
percentagem das pessoas que passaram de uma condição econômica mediana para a
pobreza e muitos migraram da pobreza para a extrema pobreza. Segundo os dados mais
recentes do IBGE, em 2018 o país tinha 13,5 milhões de pessoas em situação de
extrema pobreza, de acordo com critérios do Banco Mundial. Somadas aos que estão na
linha da pobreza, chegam a 25% da população do país.
A extrema pobreza aumentou de 5,8% da população em 2012 para 6,5% em
2018 - um recorde em sete anos. Por conta das incertezas que envolvem a realização do
CENSO em 2021, que deixou de ser realizado em 2020, os dados estão desatualizados
em relação ao impacto da pandemia na realidade social, porém, com estatísticas de 2019
a realidade já era impactante: Segundo o IBGE, o Brasil tem quase 52 milhões de
pessoas na pobreza que, de acordo com dados do Banco Mundial, vivem com até R$
436 por mês, e 13 milhões na extrema pobreza que, de acordo com os mesmos dados,
vivem com até R$ 151 por mês. Refletimos.
A crise econômica expôs o que já era cotidiano no país: a concentração de renda e a
proliferação da pobreza. O fenômeno não é exclusivo do Brasil, no entanto, a disparidade entre
a concentração e a desigualdade foram desvelados de maneira inapelável pelo COVID-19. As
pessoas têm obtido menos renda, cortado suas despesas básicas, educação, e até funcionários,
como doméstica, para continuarem a sobreviver.
Se no Brasil a desigualdade se acentua, no mundo, o COVID-19 também desvelou o
incremento da disparidade econômica e social. Segundo a Organização Mundial de Saúde, os
países de alta renda, com 15% da população mundial compraram 45% de todas as vacinas. Ao
passo que dez países, a maioria da África, sequer aplicaram uma única dose.
Se a desigualdade e a concentração de renda aumentam tanto no Brasil como no
mundo, como, então, o Governo Federal poderá resolver ou minorar o problema? A resposta
não é simples e envolve, além de planejamento, ações concretas em políticas públicas que o país
não investe de maneira adequada, como a infraestrutura.
Enquanto a população não está apta a retomar o trabalho presencial em sua totalidade,
ou nem perto disso, aperfeiçoamentos podem e devem ser feitos no orçamento federal. Como
dissemos, a atual missão do Governo Federal é lidar com os efeitos da pandemia, a
desigualdade, o aumento da pobreza e da pobreza extrema sem comprometer ainda mais
as contas. Claro está que são necessárias políticas públicas para resolver os problemas e
antigas soluções podem trazer resultados aquém do esperado.
O primeiro passo é a reestrutura e adequação de programas sociais já existentes
como, por exemplo, o Bolsa Família. Os programas sociais já consomem R$150
bilhões, sem políticas extraordinárias da pandemia. A questão que se coloca é: o valor é
proporcional à efetividade do resultado? Há margem para aperfeiçoamento e
aprimoramento. A inserção para acesso prioritário a educação, uma maior equalização
entre o sistema público e privado, acesso ao mercado de trabalho, qualificação
profissional, melhor assistência básica e educacional são alguns dos pontos que podem e
devem ser revistos.
Para mitigar os efeitos da pandemia e minorar o impacto da desigualdade social
e econômica o Brasil precisa investir em infraestrutura e em educação. O país tem
colhido, sem nenhum trocadilho, resultados positivos com o agronegócio, porém,
seguem sendo a mola motriz do PIB o terceiro setor – os serviços – e a exportação de
bens primários. A indústria ainda claudica e padece. Há a carência evidente de um
projeto de desenvolvimento econômico e social para o Estado Brasileiro. Mas como
implementar mudanças se as pessoas não estão vacinadas e aptas a trabalhar de maneira
plena e sem restrições?
A prioridade para a retomada econômica brasileira é o avanço da vacinação no
Brasil. É sabido que o país possui dimensões continentais e por isso a distribuição de
vacina não é simples ou imediata, porém, enquanto o mundo vê queda de 14% dos casos
de COVID-19 – a Europa com 25% –, o Brasil ainda segue no ritmo diametralmente
oposto, com índices de crescimento da infecção, inclusive com risco de uma terceira
onda, sendo que, atualmente, ocupa o segundo lugar na América Latina – somente atrás
da Argentina – e com a agudização de casos na Índia.
A demora na vacinação impede que novos postos de trabalho sejam criados, que
estratégias inéditas sejam feitas e que novos negócios comecem a serem realizados.
Hoje o compasso é de espera, o que mais parece uma agonia. A escala de vacina prevê
que adentraremos o primeiro semestre de 2022 ainda sem ter os jovens vacinados, um
atraso acentuado para a retomada. O plano de crescimento do Governo Federal claudica
e se não for feita uma estratégia de ação voltada para a infraestrutura e a educação,
como dissemos, os danos ainda demorarão mais tempo para serem revertidos.
A crise, a desigualdade, a concentração de renda somente aumentam e se
acentuam. O Governo Federal tem a áspera missão de fazer o seu papel: construir novos
caminhos para o país, porém, falha miseravelmente, pois, não investe em vacina, não
incrementa a velocidade da mesma e, tampouco, se preocupa com o desenvolvimento da
indústria através de investimento em infraestrutura e, tampouco, se preocupa com a
educação. Enquanto não investir maciçamente em nossas crianças e na base da indústria
o Brasil seguirá colhendo mais do mesmo: desigualdade e desesperança. Que se pense
menos em eleições e desculpas e mais na população e no futuro da Nação.
Antonio Baptista Gonçalves é Advogado, Pós-Doutor em Desafios en la
postmodernidad para los Derechos Humanos y los Derechos Fundamentales pela
Universidade de Santiago de Compostela, Pós-Doutor em Ciência da Religião pela
PUC/SP, Pós-Doutor em Ciências Jurídicas pela Universidade de La Matanza. Doutor e
Mestre em Filosofia do Direito pela PUC/SP, MBA em Relações Internacionais da
Fundação Getúlio Vargas; Especialista em Direitos Fundamentais pela Universidade de
Coimbra, Especialista em Direito Penal Econômico Europeu pela Universidade de
Coimbra, Pós Graduado em Teoria dos Delitos – Universidade de Salamanca, Pós-
Graduado em Direito Penal Econômico e em Direito Tributário pela Fundação Getúlio
Vargas – FGV, Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e em
Filosofia pela PUC/SP.